domingo, 27 de novembro de 2016

Altruísmo entre as espécies: um paradoxo?


Essa nem é a minha área de expertise, minha graduação é de Tecnologia em Redes de Computadores. Mesmo assim, como sou entusiasta do tema, ouso tecer algumas linhas sobre o tema ainda que correndo o risco de ser mal compreendido ou de equivocar-me em alguns pontos, nesse caso, até encorajo os leitores a se sentirem confortáveis em comentar os tais pontos de equívocos, mas o façam de forma dedicada e pontual a fim de contribuir para o bom entendimento de todos.

Este texto nada mais é que uma espécie de resumo daquilo que andei pesquisando nos últimos anos sobre o assunto. Particularmente, acho o tema muito complexo e isso talvez se justifique pelo fato de haver tantas divergências entre os cientistas ortodoxos e os não ortodoxos. Entretanto, há um consenso majoritário em que me baseio para expor minhas ideias, mesmo que as linhas que se seguem não tenham a pretensão de defender os méritos da maioria, mas tão somente tomá-los como base para nosso raciocínio.

Parece que a sociedade moderna tem tratado o tema egoísmo como algo nocivo e até mesmo imoral. Esse tratamento tem sugerido que o altruísmo deve substituir o egoísmo como uma forma redentora e viável para a evolução das espécies, especialmente a humana. Não quero dizer com isso que devemos incentivar as pessoas a serem cada vez mais egoístas, não se trata disso, mas terei atingido o meu objetivo se esta dissertação mostrar às pessoas que fazer o que é moralmente recomendável ou fazer o bem são traços de um possível altruísmo genuíno que estamos tentando desenvolver nos rebelando contra nossa própria natureza e que, portanto, não devemos ser tão rápidos em afirmar que o altruísmo genuíno existe.


Uma rápida pesquisa no Google e percebe-se a existência de variados níveis de punições para as pessoas cujos atos egoístas são descobertos: exclusão de grupos sociais e imposição de culpa são alguns exemplos dessas punições. Nesse sentido, é óbvio que as recompensas dadas às pessoas que se comportam de forma “altruísta” também ajudam a reafirmar a ideia de que os egoístas, de modo geral, são pessoas ruins e imorais. Essas recompensas também podem variar e podem partir de um simples elogio.

No entanto, essa tendência interessante não deverá banir o egoísmo das espécies e nos dá a falsa ideia de que todo bem que praticamos hoje, é, de fato, altruísmo genuíno, mas que são apenas rascunhos de um altruísmo verdadeiro que, evolutivamente, estamos tentando aperfeiçoar ainda que não haja consenso entre os cientistas sobre a certeza da compatibilidade entre o altruísmo e a seleção natural de Darwin já que indivíduos, genuinamente altruístas, não coexistiriam amigavelmente com indivíduos egoístas, constituindo-se um paradoxo.

É claro que hoje, devido à abundância de recursos como conseqüência da estratégia egoísta da cooperação e da reciprocidade, proposta por Robert Trivers e razoavelmente resumidas e explicadas pela soma das teorias de seleção em níveis diferentes defendida por David Sloan Wilson, não há que se imaginar disputas mortais por comida com freqüência, muito embora tais comportamentos egoístas ainda existam entre a maioria das espécies quando os indivíduos estão em situação de sobrevivência, o que foi observado na história recente e que pode voltar a acontecer entre os humanos. A famosa Lei da Sobrevivência é egoísta e talvez a mais egoísta de todas (“primeiro eu”), mas extremamente necessária e lógica quando as disputas são internas ou entre grupos, ou seja, a ideia é mostrar, por exemplo, que em um grupo de egoístas e verdadeiros altruístas situados em local com limitação de alimento e espaço, os mais altruístas tendem a desaparecer primeiro e os mais egoístas tendem a ficar por último. É óbvio que, em princípio, restando apenas egoístas, isso poderia resultar em aniquilação total dos egoístas em virtude de suas naturezas, mas veremos que os genes deram um jeito de desenvolver uma estratégia ainda mais egoísta de coexistirem usando a reciprocidade positiva e a cooperação a fim de alcançarem um objetivo egoísta em comum.

Antes, tomemos como base alguns conceitos sobre o que é egoísmo, altruísmo, bem, mal, cooperação e reciprocidade, a fim de evitarmos desentendimentos e choques conceituais:

Altruísmo:

O altruísmo possui dois conceitos ligeiramente distintos. Na doutrina cotidiana, altruísmo é entendido como sinônimo de caridade e filantropia, portanto, a simples “inclinação para procurarmos obter o bem para o próximo.” (dicionário Aurélio), pode e é entendida como altruísmo ainda que haja lucro para quem o pratica. É importante frisar: em minha fala, uso a expressão “altruísmo incompleto (R. Dawkins)” ou “altruísmo recíproco (R. Trivers)” para referir-me a este tipo de altruísmo. 

Do ponto de vista científico (evolutivo), altruísmo assume um significado menos amplo, pois, para que o comportamento altruísta seja observado, deverá haver uma perda em maior ou menor grau, mas significativa, para o individuo que se propõe a ser altruísta. Esse conceito de altruísmo genuíno, que não é sinônimo de solidariedade ou filantropia, é mais antigo e foi criado pelo filósofo francês Augusto Comte para fazer oposição direta ao egoísmo: que são inclinações em favor de si próprio ou de uma coletividade visando ganhos de forma imediata ou não. Segundo a filosofa e escritora romancista Ayn Rand, se o conceito de altruísmo se opõe diretamente ao egoísmo, logo, não basta fazer o que é moralmente certo ou simplesmente fazer o bem, é necessário que haja uma perda significativa ou risco suficientemente grande, do ponto de vista do altruísta, para que seja considerado um altruísmo que se opõe ao egoísmo. O prejuízo ao altruísta, nesse caso, é necessário. Chamaremos este altruísmo de “altruísmo genuíno”.

O altruísmo genuíno é o altruísmo ao qual se referem em seus livros e artigos os cientistas W. D. Hamilton, John Maynard Smith, George Price e mais recentemente Richard Dawkins em seu livro O Gene Egoísta, cuja leitura recomendo.

Egoísmo:

O egoísmo é o hábito ou a atitude de uma pessoa de colocar seus interesses, opiniões, desejos e necessidades em primeiro lugar em detrimento (ou não) do ambiente e das demais pessoas com que se relaciona, ainda que os ganhos e benefícios sejam imediatos ou tardios. Neste sentido, é o antônimo de altruísmo.

No caso de egoísmo, parece não haver divergências de conceitos.

Bem

Pelo dicionário Aurélio, parece que o conceito de bem é muito simples: 1. O que é bom, lícito e recomendável. Fora do dicionário, o significado de bem pode ser mais complexo porque, a depender do ponto de vista cultural ou religioso, o que é bem pra mim pode ser mal pra você e vice-versa, logo, o significado de bem pode variar, mas o conceito acima é o mais comumente aceito entre as diferentes culturas.

Mal

1. O que é oposto ao bem.  (dic. Aurélio). Do mesmo modo que o bem, pode ter um conceito mais complexo.

Empatia

A empatia pode ser definida pela capacidade psicológica de colocar-se no lugar de outro indivíduo como se ele fora. Em outras palavras: pôr-se no lugar do outro, porém, sem perder a condição de “como se”. A empatia implica, por exemplo, sentir a dor ou o prazer do outro como ele o sente e perceber suas causas como ele as percebe, contudo, sem perder de vista que se trata da dor ou do prazer do outro (capacidade complexa para muitas espécies). Pelo dicionário Aurélio: 1 Forma de identificação intelectual ou afetiva de um sujeito com uma pessoa, uma ideia ou uma coisa.

Cooperação

Ato de cooperar; operar simultânea ou coletivamente (Aurélio). Cooperação é uma ação conjunta para uma finalidade, objetivo em comum. Cooperação é uma relação baseada entre indivíduos ou organizações, utilizando métodos mais ou menos consensuais. (Wikipédia).

O “altruísmo cooperativo” ou “altruísmo da reciprocidade” de Robert Trivers, tem sido estudado por alguns cientistas, inclusive por Dawkins, como sendo traços evolutivos de um altruísmo genuíno. Exploraremos essa questão mais adiante.

Reciprocidade

1. Caráter do que é recíproco. 2. Mutualidade. (Dic. Aurélio). Em psicologia social, reciprocidade refere-se a responder uma ação positiva com outra ação positiva, e responder uma ação negativa com outra negativa. Ações recíprocas positivas diferenciam-se de ações altruístas porque ocorrem somente como decorrência de outras ações positivas; diferenciam-se de uma dádiva social porque esta é concedida na esperança ou expectativa de respostas positivas futuras. (Wikipédia). Pode ser encarada como uma das variantes de egoísmo uma vez que a reciprocidade positiva visa sempre benefícios imediatos ou não para quem a pratica.

***

Considerações

O meu objetivo aqui não é demonstrar que os genes se comportam de forma egoísta, uma vez que estudiosos do assunto já o fizeram com mais propriedade. Como também, não estou defendendo uma teoria nova, toda apologética desta dissertação está baseada em estudos e teorias de cientistas que foram pioneiros na defesa das ideias que se seguem.

É desnecessário dizer que, tão importante quanto os conceitos acima, é levar em consideração que a teoria ortodoxa do egoísmo dos genes é um consenso entre a maior parte dos cientistas atualmente, caso contrário, teremos um problema gravíssimo de premissa, o que impede o debate na linha que proponho e torna desnecessária a leitura deste artigo. O debate seguiria num outro sentido. Portanto, se o caro leitor discorda dessa premissa, não leia este artigo, leia, George C. Williams, W. D. Hamilton, G. Price, N. Burton, S.Taylor, R. Dawkins, E. O. Wilson ou qualquer outro escritor de sua preferência e depois, volte ou não, aqui para continuarmos refletindo sobre a possibilidade de haver ou não altruísmo entre as espécies, porque, o egoísmo, já é um consenso de larga aprovação, o desafio, portanto, está em demonstrar o contrário.

De posse desses conceitos e premissas, vamos às reflexões:

O altruísmo caridoso não seria uma forma de egoísmo?

Não é de hoje que os cientistas defendem a linha de argumento que sustenta que a filantropia não passa de um “egoísmo travestido”, alguns dos quais já foram citados aqui. Dessa linha de pensamento surgiu, em 1974, a conhecida máxima “arranhe um altruísta e verás um egoísta sangrar” de Michael Ghiselin, biólogo americano.

Um cientista que também se destaca com essa linha argumentativa é Neel Burton, psiquiatra e professor da Universidade de Oxford na Inglaterra. Burton argumenta: “não existe isso de um ato [puramente] altruísta que não leve a algum grau (…) de orgulho e satisfação”. “Para Burton, todo ato altruísta pode ser considerado um ato de interesse próprio por pelo menos uma das seguintes razões: alívio da ansiedade, porque leva o sujeito a ter sensações prazerosas de orgulho e satisfação, a expectativa de reciprocidade ou de receber honras da sociedade, ou porque ele liberta o sujeito de sensações ruins como culpa ou vergonha por não ter agido diante de uma situação onde ele poderia ajudar” (F. Freitas – Psicóloga). Lembro que, como exposto no terceiro parágrafo e facilmente constatável, a sociedade recompensa indivíduos que se ocupam com filantropia, o que pode levar (e nem estou generalizando) indivíduos a fazerem caridade com vistas nessas tais recompensas e reconhecimentos sociais. Do mesmo modo, a sociedade impõe culpa ou vergonha (dentre outros tipos de punições) aos indivíduos egoístas que não se ocupam com caridade.

Os benefícios do altruísmo caridoso já são velhos conhecidos da psicologia e da neurociência. Alguns profissionais chegam a receitar o altruísmo aos pacientes visando os benefícios que ele pode trazer:

“Dos benefícios físicos, existe o relaxamento muscular, liberando tensões e aliviando dores em locais doloridos, liberação do hormônio oxitocina que tem ação cardioprotetora. Além disso, alguns estudos já demonstraram que pessoas altruístas têm seu nervo vago, um nervo responsável pelo controle de inflamações, mais ativo.

Psicologicamente falando, o altruísmo melhora a autoestima e autoconfiança, além de ser ótimo no controle do stress, depressão e ansiedade. Além disso, a oxitocina citada acima é um hormônio que nos ajuda a nos sentirmos mais próximos e conectados às outras pessoas.” (F. Freitas  - Psicóloga e Psicanalista pela USU/RJ).

Os benefícios obtidos a partir do alívio do stress causado pelo sentimento de culpa ou vergonha são indiscutíveis, pois chegam a prevenir doenças. O problema é: diante de tantos benefícios, não seria natural que os cientistas questionassem a genuinidade desses “altruísmos”? Parece-me lógico responder que sim já que essas ações estão mais pra ações egoístas que para ações altruístas se nos basearmos nos conceitos de egoísmo e altruísmo genuíno descritos acima, ou seja, além de não haver perdas significativas para o individuo que se propõe ao altruísmo da filantropia, a relação custo benefício dá, efetivamente, algum tipo de vantagem imediata ou tardia ao ”altruísta” de plantão.

Steve Taylor, psicólogo e professor da Universidade Metropolitana de Leeds, compartilha da mesma opinião de Burton (de Hamilton, de Price, de Wilson, de Dawkins, entre outros), quando afirma que o altruísmo puro não existe porque sempre receberemos algo em troca, ainda que de forma inconsciente. Assim, não sejamos rápidos em afirmar que ações de filantropia e solidariedade são, de fato, um comportamento genuinamente altruísta. Muita calma nesta hora! Pode ser tentador usarmos o argumento da experiência pessoal (anedótica) aqui. Alguns já me garantiram: “Ah! Quando eu faço caridade, o faço sem interesses..."; "... Quem é você pra dizer se faço ou não caridade por interesses?”. Eles não perderam tempo! O problema é que essa linha argumentativa é falaciosa.

Taylor chama a atenção para outra característica humana que pode explicar o altruísmo [ainda que de forma não definitiva] quando executado de forma inconsciente e alheia aos ganhos. Para Steve, a empatia é algo essencial e determinante para alguns de nós agirmos de forma altruísta, ou seja, é algo como um pré-requisito, algo que precede o comportamento altruísta. Mas, como vimos, a empatia é a capacidade psicológica de se colocar no lugar de outro individuo como se fosse ele e, por definição, isso já torna mais improvável o comportamento altruísta entre algumas espécies de animais devido à clara incapacidade de possuir empatia. Alguns comportamentos, aparentemente altruístas, entre algumas espécies de animais devem ser estudados com cautela ou utilizaremos casos raros, isolados e aleatórios para defender uma linha de pensamento que surpreende pela proposta que sugere que os animais evoluíram, nesse sentido, antes mesmo que se pudesse comprovar, com larga aprovação da comunidade científica, que os humanos, cujo cérebro é o mais desenvolvido dentre as espécies, conseguissem alcançar tal grau de evolução.

Ainda pegando “carona” no que a psicóloga e psicanalista F. Freitas escreveu em seu artigo O altruísmo verdadeiro, existe?:

“A discussão parece não ter fim e muitos filósofos e cientistas terão diferentes posições. No entanto, outras questões morais surgem a partir dessa discussão. Por exemplo, devemos julgar com um olhar severo pessoas que praticam o altruísmo? Devemos aceitar a ajuda de alguém que ofereça porque suspeitamos que ela tenha motivos menos “nobres”? Neel e Steve acreditam que todo altruísmo, egoísta ou não, deve ser celebrado, uma vez que faz do mundo um lugar um pouco melhor, mas sugerem que você seja o próprio juiz do altruísmo quando se deparar com ele.”

Dawkins é outro que compartilha desse mesmo pensamento quando diz em O Gene Egoísta “... se o leitor desejar, como eu, construir uma sociedade em que os indivíduos cooperarem generosa e desinteressadamente para o bem-estar comum, ele não deve esperar grande ajuda por parte da natureza biológica.”. Todos nós queremos um mundo melhor, mas a nossa “natureza biológica” parece não concordar que o altruísmo seja a solução para os nossos problemas, nesse caso, fazer o bem, fazer o que é moralmente certo, já nos basta.

Mas eu ainda faria um adendo: acredito muitíssimo não apenas na nobreza de quem pratica a filantropia como defendo que, ao fazê-lo, estamos rascunhando e ensaiando os primeiros passos evolutivos na tentativa de aperfeiçoarmos um possível altruísmo genuíno ao mesmo tempo em que duvido de que outras espécies consigam tamanha façanha antes de nós.

Eu não poderia deixar de citar mais uma vez Richard Dawkins aqui, porque tanto quanto Hamilton e outros, Dawkins, deu contribuições importantíssimas que facilitaram a compreensão da evolução das espécies e, diferente de George C. Williams, ele popularizou o modelo de “unidade seletiva” como se conhece hoje.

Dawkins, diferente de Burton e Taylor, aborda esse tema com mais suavidade. Freqüentemente em programas de TV ou em documentários facilmente encontrados no YouTube, ele fala muito em “altruísmo limitado” entre os animais, contudo, sem deixar claro de que tipo de “altruísmo” ele está falando, o que pode levar o leigo a confundir os conceitos postulados acima. Alguém poderia se perguntar: mas como alguém poderia dizer que Dawkins, defensor da teoria do gene egoísta, falou em haver altruísmo genuíno entre as espécies? Seria uma grande contradição! Mas, acreditem ou não, eu ouvi essa afirmação de uma pessoa esta semana... Isso provavelmente acontece pela forma leve como Dawkins trata o assunto e talvez porque essa pessoa não conhece o argumento de Dawkins em favor de unidade seletiva (o egoísmo dos genes).

Contudo, em seus livros, ele tem sido rigorosamente cuidadoso quando fala em altruísmo entre os animais, deixando claro que está sempre se referindo a uma “forma limitada de altruísmo”. Quem leu ao menos o primeiro capítulo de O Gene Egoísta, jamais faria tamanha confusão. Em sua obra, no primeiro capítulo, quando ainda está apresentando seu livro aos leitores, Dawkins diz:

“Sustentarei a ideia de que uma qualidade predominante que se pode esperar de um gene bem-sucedido é o egoísmo implacável. Em geral o egoísmo do gene originará um comportamento individual egoísta. No entanto, tal como veremos, existem circunstâncias especiais em que um gene pode atingir mais efetivamente seus próprios objetivos egoístas cultivando uma forma limitada de altruísmo, que se manifesta no nível do comportamento individual. “Especiais” e “limitada” são palavras importantes na última frase. Por mais que desejemos acreditar no contrário, o amor universal e o bem-estar da espécie como um todo são conceitos que simplesmente não fazem sentido do ponto de vista evolutivo.”

Grande parte das discussões sobre o tema parte daqui. Confundir os conceitos de Altruísmo com o de fazer o bem é mais comum do que se imagina. Mas quando se compreende os conceitos, fica mais fácil entender a proposta de alguns cientistas mesmo quando, ao final, não concordamos com elas.
Se fazer o bem, se fazer o que é certo, se fazer o que é moralmente recomendável não é altruísmo, o que pode ser então?

Para a maioria dos cientistas, a filantropia é apenas uma forma dissimulada de egoísmo. Mas para alguns, e Dawkins inclui-se nessa lista, acreditam que a filantropia, a reciprocidade positiva e a cooperação, talvez sejam “ensaios” de altruísmo genuíno, ainda que sejam estratégias puramente egoístas que os genes desenvolveram para obterem vantagens em comum.

Algumas questões ainda continuam: como explicar os “casos especiais” de comportamentos aparentemente altruístas que encontramos entre as espécies, alguns dos quais implicam perdas ou o riscos enormes para que sejam interpretados como manifestações egoístas? 

Seleção Natural e o paradoxo do altruísmo entre as espécies

Segundo as teorias que defendem o conceito de “unidade seletiva”, como proposta por George Williams na década de 60, genes genuinamente altruístas não poderiam coexistir em harmonia com genes egoístas dividindo pouco espaço e recursos, pelo menos, isso não poderia prosperar por muito tempo ainda que não dividissem inicialmente o mesmo espaço. Pois os genes altruístas agiriam sempre de forma verdadeiramente altruísta em favor dos genes egoístas e em desfavor de si próprios, o que implicaria perdas severas e até mesmo no desaparecimento dessa característica genética que, não raramente, sacrificariam a própria existência em favor dos genes egoístas que acabariam os explorando. Com a palavra, Richard Dawkins:

“A resposta imediata do adepto da "seleção individual" ao argumento apresentado poderia ser mais ou menos como segue. Mesmo no grupo de altruístas haverá, quase certamente, uma minoria dissidente que se recusará a fazer qualquer sacrifício. Se existir um único rebelde egoísta, pronto a explorar o altruísmo dos restantes, ele terá, por definição, mais probabilidade do que os outros de sobreviver e de procriar. Cada um dos seus filhos tenderá a herdar seus traços egoístas. Após várias gerações dessa seleção natural, o "grupo de altruístas" será dominado pelos indivíduos egoístas e desse grupo se tornará indistinguível. Mesmo admitindo o acaso improvável da existência inicial de grupos altruístas puros, sem nenhum indivíduo rebelde, é muito difícil antever o que seria capaz de impedir a migração de indivíduos egoístas, provenientes de grupos egoístas vizinhos e, por casamento cruzado, a contaminação da pureza dos grupos altruístas.” (O Gene Egoísta)

Nesse cenário lógico, se toda vez que um indivíduo egoísta se encontrasse em apuros e os altruístas agissem eu seu favor e essas ações implicassem em custos e até na morte, como conceber que o altruísmo genuíno deveras pudesse prosperar?

Pela teoria darwiniana dos replicadores, comumente aceita, todos os esforços genéticos são no sentido de fazer cópias de si mesmos e de proteger os veículos que transportam suas réplicas a fim de garantir a longevidade de suas características genéticas. O problema é que no cenário acima, os genes altruístas jamais prosperariam haja vista que suas ações, sempre altruístas e nunca egoístas, não resultariam em vantagens, mas em prejuízos.

Digamos que, em algum momento da evolução, em alguns indivíduos A, B, C, e D, aflorou a característica genética altruísta. Na primeira oportunidade que tivesse, o primeiro individuo genuinamente altruísta A, não perderia tempo em ajudar outro individuo B em apuros, cuja ação poderia implicar sua própria morte (é necessário que haja algum prejuízo para A). Ainda que o individuo em apuros (B) seja também altruísta e o nosso herói (A) tivesse sobrevivido (ainda que com os prejuízos) à sua ação altruísta, a repetição desse ciclo por si só seria altamente prejudicial e anti-evolutivo devido aos custos. Em algum momento, tanto pelo acúmulo de perdas quanto pelo risco da ação, não haveria como ajudar o individuo em apuros C e ambos morreriam já que o instinto altruísta falaria mais alto e não permitiria que nosso herói (A) hesitasse. O beneficiário e sobrevivente altruísta (B) em algum momento faria o mesmo com o último individuo altruísta D e todos teriam desaparecido.

O problema é que jamais se cogitou em grupos primitivos essencialmente altruístas (o altruísmo seria mais recente) e o exemplo acima, embora lógico, não encontra amparo na seleção natural de Darwin. Por causa do prejuízo do resultado lógico acima, os primeiros genes, necessariamente, foram todos egoístas e, logo, temos um problema ainda maior: num grupo de indivíduos egoístas, um individuo altruísta seria, no mínimo, explorado e estaria condenado a desaparecer rapidamente, isso se ele não desaparecesse numa primeira ação suicida.

Um olhar mais rigoroso sobre o exemplo acima e descobriremos que, para ser chamado de altruísta, o individuo teria de ter agido como tal, antes, para então merecer efetivamente o título. Isso reduziria os altruístas do nosso exemplo ou poderíamos dizer, com o mesmo rigor, que muitos altruístas receberam o título no momento da morte.

Em contrapartida, para que os genes egoístas superassem o obstáculo das disputas internas que resultavam em prejuízo, bastou que mudassem de estratégia egoísta e aprendessem o princípio da reciprocidade e da cooperação, ou seja, passaram a usar uns aos outros em beneficio próprio e do grupo. Nas disputas entre grupos é mais fácil e lucrativo competir pertencendo a um grupo do que competir sozinho. As eventuais deserções comuns aos indivíduos egoístas, passaram a ser diminutas já que as punições impostas pelo grupo ou conseqüências oriundas das deserções, são bem maiores que os "malefícios" que a cooperação e a reciprocidade positiva podem trazer.

Dawkins, disse no mesmo livro: “Tratemos então de ensinar a generosidade e o altruísmo, porque nascemos egoístas. Tratemos de compreender o que pretendem os nossos próprios genes egoístas, pois só assim teremos alguma chance de perturbar os seus desígnios, algo que nenhuma espécie jamais aspirou fazer.”

Vamos abusar um pouco e imaginar um cenário perfeito de altruísmo genuíno nos dias de hoje? O leitor fique à vontade. De antemão, esse cenário é, por definição, tão raro quanto improvável, por isso queiram me perdoar os leitores mais ortodoxos. Mas não é tão difícil imaginá-lo. Pois bem... Acho que todos partiremos da premissa de que hoje existem mais pessoas egoístas que genuinamente altruístas. Então, uma alegoria imaginária perfeita seria: 1. Um indivíduo A agiu de modo que perdeu a sua vida na tentativa de salvar um egoísta B. O beneficiário (B) se salva e permanece vivo para se reproduzir e garantir a longevidade de seu genes egoístas ao passo que nosso herói morreu lindamente com o título de altruísta. Logo, terá sido um caso único e, portanto, anti-evolutivo, pois A não poderá mais passar suas características nem por reprodução, nem por meme. Sua variante seria: 2. Um individuo X agiu de modo que perdeu sua vida na tentativa de salvar um egoísta Y . O beneficiário (Y) e o herói (X) morrem juntos, mas o altruísta (X) tinha um filho (Z) que, além de ter ficado órfão e sem proteção, aprendeu por meme observando o pai a como obter o título fúnebre de altruísta ajudando outro egoísta. Provavelmente, esse filho acabará como o pai e o gene altruísta, inevitavelmente, desaparecerá ajudando genes egoístas a manterem-se vivos, ativos e sempre em maior quantidade.

Um terceiro cenário onde o altruísta permanece vivo não ajuda, ao contrário do que muitos podem pensar, porque, além de não ser um exemplo perfeito, dando margens à interpretações, o nosso herói será, querendo ou não, recompensado pela sociedade de alguma forma e tenderá a se sentir bem recebendo recompensas da sociedade atual que, no mínimo, louva e elogia esse tipo de comportamento e, portanto, acabaria por se corromper com o tempo. O outro problema, ainda mais grave, é que se ele tivesse sobrevivido à ação altruísta, tendo ficado apenas com danos, ele seria explorado até a morte e, do mesmo modo que nos outros cenários, desapareceria do mapa em pouco tempo.

Notem: ainda que comportamentos genuinamente altruístas surjam em meio a uma sociedade egoísta, eles tenderão a desaparecer por meio da seleção natural de Darwin.

Como explicar casos de aparente altruísmo na natureza? Burton e Taylor diriam que sempre haverá uma forma de explicar por uma perspectiva egoísta, pois assim como alguns indivíduos poderiam agir inconscientemente e despretensiosamente movidos por instintos altruístas, outros agem inconscientemente e despretensiosamente movidos por instintos egoístas. Logo, se somos essencialmente egoístas pela força da natureza, por que insistimos em interpretar os casos de uma perspectiva altruísta? Bom... Isso é, no mínimo, curioso. Mas há um desejo contínuo de nos tornarmos melhores do que somos e de tornar o mundo onde vivemos um lugar melhor e estamos acreditando que, se os humanos se tornassem altruístas genuínos, o mundo seria um lugar melhor para viver.

Esse desejo pode estar influenciando esse comportamento, ainda que de forma inconsciente, porque interpretar altruisticamente alguns casos, mesmo tendo consciência plena de que eles são raros, isolados e improváveis, seria “moralmente mais aceitável” que interpretá-los por uma perspectiva egoísta e, portanto, uma interpretação cultural mais “do bem” que “do mal”, mais “religiosa” que “científica” etc. Contudo, ela permanece utópica. Bastaria que todos tivessem a consciência de fazer o bem, aprender a cooperar e o princípio da reciprocidade positiva e seria o suficiente, pelo menos, enquanto houvessem recursos (espaço e alimento).

Uma alegoria: alguém aí já assistiu The Walking Dead?

A série constitui-se apenas um exemplo prático de como agiríamos em cenário de caos absoluto. Os autores Frank Darabont e Robert Kirkman escreveram o drama tomando como base a tendência egoísta do comportamento humano em situações de sobrevivência, ou seja, em grupo ou não, o comportamento das pessoas é egoísta ao extremo.

No drama, os sobreviventes tendem a formarem grupos, pois isso aumenta exponencialmente as chances de sobrevivência, exatamente como a teoria do gene egoísta explica a sobrevivência das espécies associada à teoria da seleção natural de Darwin. O comportamento da reciprocidade positiva e da cooperação pode ser observado entre os personagens, bem como sugeriu R. Trivers de forma genial. Outros comportamentos cruéis e execráveis também são observados nos momentos em que os recursos ficam ainda mais escassos.

O mais interessante e que merece nossa atenção, é o fato de como as teorias de Seleção de Parentesco, Seleção de Grupo e Seleção Multinível podem ser observadas na série do mesmo modo que na natureza. Porém todos os comportamentos, sem exceção, são predominantemente egoístas porque, o que impera no drama, é a lei da sobrevivência.

A questão da Seleção de Grupo: novos conceitos

Quando foi apresentada por V. C. Wynne-Edwards e mais tarde popularizada por Robert Ardrey em The Social Contract, a seleção de grupo parecia que era uma resposta rápida e intuitiva para alguns casos especiais de aparente altruísmo, mas, quando da proposta dessa teoria, muitos problemas surgiram, o maior deles era que seus autores propuseram que o importante na evolução é o bem da espécie ou do grupo ao contrário da teoria dawiniana que defende que a seleção se dá em níveis mais baixos (no do individuo). Konrad Lorenz, autor de Sobre a agressividade, também pensou como eles e ignorou completamente que a evolução opera por meio da seleção natural. Dawkins diz que eles “... erraram, total e completamente.” e segue:

Embora a teoria da seleção de grupo conte com poucos adeptos hoje em dia entre os biólogos profissionais que compreendem a evolução, ela continua a exercer forte apelo intuitivo. Gerações e gerações de estudantes de zoologia se surpreendem, quando deixam o ensino secundário, ao descobrir que não é esse o ponto de vista ortodoxo. Não se podem culpá-los por isso, uma vez que no Nuffield Biology teacher's guide, escrito para os professores que lecionam Biologia em nível avançado nas escolas, encontramos o seguinte: "Nos animais superiores, o comportamento pode assumir a forma do suicídio individual para assegurar a sobrevivência da espécie". O autor anônimo desse manual ignora, satisfeito, o fato de que sua afirmação é controversa. A esse respeito, ele faz companhia a cientistas que ganharam o prêmio Nobel. Konrad Lorenz, no livro On aggression, discorre sobre a função de "preservação da espécie" exercida pelo comportamento agressivo, que teria entre suas finalidades assegurar que apenas aos indivíduos mais aptos seja permitido procriar. Este é um exemplo notável de argumentação circular. Mas o que quero enfatizar aqui é que a idéia da seleção de grupo está tão profundamente enraizada que tanto Lorenz como o autor do Nuffield guide não se deram conta de que suas afirmações eram incompatíveis com a teoria darwiniana ortodoxa.

O problema é que desde os primeiros grandes debates na década de 60 sobre a questão quando Wynne-Edwards publicou um modelo mais específico de seleção de grupo tendo sido muito criticado por vários geneticistas teóricos evolutivos, como Maynard-Smith, George C. Williams e William Hamilton, muita coisa mudou. Entre essas mudanças podemos citar dois fatos principais:

O primeiro deles foi o surgimento de novos modelos de seleção dando origem a ideia da chamada “seleção multinível”.

O segundo deles foi a formulação da chamada equação de Price e a reinterpretação do conceito de ‘aptidão inclusiva’, antes considerada a antítese da ideia de seleção de grupo, mas que, mais tarde (como admitido pelo próprio William Hamilton que formulou o conceito originalmente) como sendo passível de ser interpretado dentro da perspectiva da seleção de grupo. O que ocorreu foi que George Price desenvolveu uma equação que particiona a seleção natural total em uma população em componentes intra- e intergrupos. Isso mostrou que em várias condições a seleção entre os componentes grupais poderia plausivelmente prevalecer sobre aquela ocorrendo nos componentes individuais. Segundo, Sloan Wilson, quando o próprio Hamilton analisou sua própria teoria da aptidão inclusiva em termos da equação de Price, ele percebeu que o altruísmo expresso entre parentes seria seletivamente desvantajoso dentro de grupos de parentesco e só poderia evoluir caso houvesse uma contribuição diferencial de diferentes grupos de parentesco para a população como um todo.

De certo modo a questão tornou-se muito mais semântica do que qualquer outra coisa. Infelizmente, a discussão ainda é bastante contaminada pelas discussões passadas que fazem alguns críticos repetirem argumentos inadequados e insistir em equívocos que deveriam ter sido, há muito, superados e por causa de certos estereótipos e da linguagem pouco rigorosa empregada na hora de se falar de seleção de grupo que ainda é comum entre alguns dos simpatizantes desta abordagem que não trabalham diretamente com estes modelos e não parecem ter acompanhado os avanços dos últimos 40 anos.

O Problema de Dawkins

Como o leitor já deve ter percebido, compartilho das opiniões de Dawkins em muitos aspectos, principalmente àqueles que tangem a questão da teoria do gene egoísta, dos indivíduos como máquinas programadas pelos genes, dentre outras. Mas discordo completamente do radicalismo de Dawkins quanto a questão de Seleção Multinível, particularmente acredito que seleção pode acontecer em níveis diferentes sem o prejuízo da teoria do gene egoísta nem da seleção natural quando consideramos os novos conceitos de Seleção de Grupo. A ortodoxia de Dawkins tem feito com que ele continue insistindo (isso porque não tenho conhecimento do contraio até hoje) em afirmar que a seleção acontece no mais baixo do todos os níveis, mais precisamente no nível dos genes.

Quanto a essa questão, David Sloan Wilson em seu artigo sobre seleção de grupo e seleção multinível, critica duramente essa postura de Dawkins e eu concordo com todas elas.

Mesmo que a teoria de unidade seletiva explique razoavelmente bem como a evolução acontece, em alguns casos, a seleção em níveis diferentes parece se sair melhor e, ao contrário dos antigos conceitos de Ardrey e Lorenz de seleção de grupo, não entra em choque com a seleção na natural dawiniana, aliás, segundo Eliott Sober, Darwin até invocou isso repetidamente no corpus de seu trabalho, por outro lado, Dawkins argumenta que Darwin invocou seleção de grupo em apenas "uma passagem anômala". Mas o fato é que ele precisa ler e refutar o artigo de Sober, caso contrário, continuaremos acreditando que seleção pode acontecer em níveis diferentes constituindo-se uma teoria tão plausível quanto a teoria de unidade seletiva, muito embora uma não vá de encontro a outra, particularmente, acredito que elas se completem, pois são egoístas por excelência.

Altruísmo e egoísmo na sociedade

Sobre esse tema, Dawkins explora com bastante precisão de modo que passo a reproduzi-lo:

Em tempos recentes temos presenciado uma reação contra o racismo e o patriotismo e uma tendência a adotar a espécie humana no seu conjunto como o objeto dos nossos sentimentos de solidariedade. Esse alargamento humanista do alvo do nosso altruísmo possui um corolário interessante, que, uma vez mais, parece reforçar a idéia da evolução "pelo bem da espécie". Os politicamente liberais, que são, em geral, os porta-vozes mais convencidos da ética da espécie, demonstram hoje o maior desdém por aqueles que foram um pouco mais longe no alargamento do seu altruísmo, de maneira a incluir as outras espécies. Se eu disser que estou mais interessado em impedir o massacre das grandes baleias do que em melhorar as condições de moradia da população, certamente deixarei alguns amigos chocados.

A idéia de que os membros da nossa própria espécie merecem uma consideração moral especial em comparação com os membros das demais espécies é antiga e profundamente arraigada. Matar pessoas fora de uma guerra é algo que se considera o pior dos crimes vulgarmente cometidos. A única coisa proibida com mais força pela nossa cultura é comer pessoas (mesmo que já estejam mortas). E, no entanto, gostamos de comer membros das outras espécies. Muitos de nós recuamos constrangidos diante da execução de um ser humano, não obstante se trate do mais terrível criminoso, ao passo que defendemos despreocupados a exterminação sem julgamento de pragas relativamente pouco nocivas. A bem da verdade, matamos membros de outras espécies inofensivas como forma de recreação e divertimento. Um feto da nossa espécie, desprovido de mais sentimentos humanos do que uma ameba, goza de um respeito e de uma proteção legais que excedem em ampla medida aqueles concedidos a um chimpanzé adulto. E, contudo, o chimpanzé sente e pensa e - de acordo com os achados experimentais recentes - é até mesmo capaz de aprender alguma forma de linguagem humana. O feto pertence à nossa espécie e, por essa razão, conta instantaneamente com privilégios e direitos especiais. Será que a ética do "especiecismo", para usar o termo de Richard Ryder, se sustenta em bases lógicas mais sólidas do que a ética do racismo? Eu não sei. O que sei é que ela não encontra nenhuma fundamentação na biologia evolutiva.

Entender como agimos de forma egoísta, pode nos ajudar a superarmos alguns tabus.


Altruísmo: aposta perigosa?

O leitor já deve ter percebido a complexidade do tema e concluído que a rapidez em apontar determinados casos de aparente altruísmo na natureza como altruísmo genuíno pode ser tão imprudente quanto absurdo. O altruísmo é de fato improvável, e quando aparece em casos isolados e raros tende a desaparecer por seleção natural.

Isso não significa que devamos deixar de fazer filantropia e caridade, pelo contrário, devemos fazer sempre o bem, devemos fazer sempre o que certo. O principio da reciprocidade de Trivers é viável, pelo menos até enquanto houver recursos para todos no planeta terra.

Agora imaginemos um cenário onde os humanos evoluíram e se tornaram todos altruístas a nível genético e é claro que estamos falando de altruísmo genuíno. Eu admito que tenho dificuldades de imaginar esse cenário, principalmente porque, por mais que eu me esforce, não consigo prever como isso poderia prosperar se hoje somos todos egoístas por força da natureza. Mas, enfim, imaginemos o produto final.

Ainda que os humanos altruístas vivam bem a nível individual e de grupos e prosperem, em algum momento, pode acontecer de recebermos visitantes de outro planeta no futuro. O problema é que provavelmente os seres extraterrestres evoluíram da mesma forma que os humanos no passado, ou seja, de forma egoísta. Mas nossa hipotética natureza altruísta não nos permitiria desenvolver estratégias egoístas para disputas entre grupos (humanos versos ETs) e seriamos exterminados do nosso planeta rapidamente. Altruísmo não seria uma aposta perigosa? Parece que a seleção natural de Darwin nos pegaria de forma implacável, de uma forma ou de outra, no presente ou no futuro. Na melhor das hipóteses, seriamos explorados até que não sobre mais ninguém.

Conclusão

Fazer o bem nos basta

A seleção natural é implacável e se queremos evoluir terá que ser por meio de seleção natural, indivíduos mais adaptados sobrevivem, quem não se adapta à realidade, morre.

Parece cruel, mas a natureza, por vezes, tem mostrado que a lei da sobrevivência é mesmo cruel. Logo, tratemos de nos adaptar!

Mas para isso, não precisamos cultivar um egoísmo impiedoso. Observar nossos princípios morais já seria o suficiente para que possamos permanecer por muito tempo na terra. Entender como os genes usam seus "veículos" pode ser crucial para nossa existência, isso nos fará pensar duas vezes antes de decretarmos guerra a outro grupo egoísta a exemplo das guerras mundiais. Fica a reflexão.



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